Na cidade
há um jardim
e no jardim um canteiro
e no meio do canteiro
está cavando o jardineiro.
A terra suja-lhe os pés,
rasgam-lhe rosas as mãos,
as dálias roçam-lhe a cara
quando se dobra para o chão.
Há um jardim na cidade
e no jardim um canteiro;
quem vê as flores que lá estão
não pensa no jardineiro.
poema de Luísa Ducla Soares
in Poemas da mentira e da verdade
ilustração de Anne Herbauts
quarta-feira, 29 de junho de 2011
segunda-feira, 20 de junho de 2011
Que o silêncio
quarta-feira, 15 de junho de 2011
A cabeça no ar
As coisas melhores são feitas no ar,
andar nas nuvens, devanear,
voar, sonhar, falar no ar,
fazer castelos no ar
e ir lá para dentro morar,
ou então estar em qualquer sítio só a estar,
a respiração a respirar,
o coração a pulsar,
o sangue a sangrar,
a imaginação a imaginar,
os olhos a olhar
(embora sem ver),
e ficar muito quietinho a ser,
os tecidos a tecer,
os cabelos a crescer.
E isto tudo a saber
que isto tudo está a acontecer!
As coisas melhores são de ar
só é preciso abrir os olhos e olhar,
basta respirar.
poema de Manuel António Pina
in em O pássaro da cabeça
ilustração de Paulo Galindro
andar nas nuvens, devanear,
voar, sonhar, falar no ar,
fazer castelos no ar
e ir lá para dentro morar,
ou então estar em qualquer sítio só a estar,
a respiração a respirar,
o coração a pulsar,
o sangue a sangrar,
a imaginação a imaginar,
os olhos a olhar
(embora sem ver),
e ficar muito quietinho a ser,
os tecidos a tecer,
os cabelos a crescer.
E isto tudo a saber
que isto tudo está a acontecer!
As coisas melhores são de ar
só é preciso abrir os olhos e olhar,
basta respirar.
poema de Manuel António Pina
in em O pássaro da cabeça
ilustração de Paulo Galindro
terça-feira, 14 de junho de 2011
Fico uma gata...
Fico uma gata assanhada
quando tocam
na minha ninhada
Fico uma gata assombrada
quando não durmo
e faço noitada
Fico uma gata zangada
quando me escondem
a querida almofada
Fico uma gata apressada
quado fujo
de uma grande chuvada
Fico uma gata afogueada
quando corro
à volta da bancada
Fico uma gata apaixonada
quando me vens esperar
à porta da entrada.
poema de Ana Ramalhete
ilustração de Yolanda Mosquera
terça-feira, 7 de junho de 2011
Entre quatro paredes
Pintei os sapatos de verde
para pisar um relvado.
Pus um vestido de rosas
com seu perfume encarnado.
Colei pratas nas janelas
como estrelas amarelas.
Fiz de uma vassoura
de pernas para o ar
uma palmeira
ao vento a cantar.
Baloiçando o baloiço
do velho cortinado
voei enfim
pelo meu jardim
inventado.
poema de Luísa Ducla Soares
em Poemas da mentira e da verdade
ilustração de Beatrice Alemagna
in Depois do Natal
No quintal ao meio-dia
sábado, 4 de junho de 2011
O abraço da serpente
Constantemente
sente a serpente
que não gostam dela
como serpente.
Só gostam dela
em pele, sem ela.
Só gostam dela
superficialmente.
Tornada mala,
cinto, corrente,
eu não me sinto
como serpente,
diz a serpente
impaciente
quase doente
incomodada
desesperada
por ser serpente.
Eu sou tão querida
tão inocente,
o meu olhar
tão transparente.
O meu abraço
é tão dormente
e o meu beijo
é tão ardente.
O meu amor
tão envolvente.
Ninguém resiste
a uma serpente.
Como há quem diga
não ser prudente
ter como amiga
uma serpente?
Diz a serpente
impaciente
quase doente
incomodada
desesperada
por ser serpente.
poema de António Torrado
in Como quem diz
ilustração de Beatrice Alemagna
sente a serpente
que não gostam dela
como serpente.
Só gostam dela
em pele, sem ela.
Só gostam dela
superficialmente.
Tornada mala,
cinto, corrente,
eu não me sinto
como serpente,
diz a serpente
impaciente
quase doente
incomodada
desesperada
por ser serpente.
Eu sou tão querida
tão inocente,
o meu olhar
tão transparente.
O meu abraço
é tão dormente
e o meu beijo
é tão ardente.
O meu amor
tão envolvente.
Ninguém resiste
a uma serpente.
Como há quem diga
não ser prudente
ter como amiga
uma serpente?
Diz a serpente
impaciente
quase doente
incomodada
desesperada
por ser serpente.
poema de António Torrado
in Como quem diz
ilustração de Beatrice Alemagna
sexta-feira, 3 de junho de 2011
A falsa pimenteira
A Falsa pimenteira
É verde
Como todas as árvores.
“Parece” verde,
Porque se é falsa deve estar a mentir.
Fingirá que dá pimentos?
Dará falsos pimentos?
Se calhar nem é árvore.
Pode não ser.
Se é falsa
Pode ser um pássaro
Ou um navio.
É dissimulada
Finge o que não é,
Esconde.
Engana.
E não é verde,
Verde é a sua cor mentirosa.
Se engana num aspecto
Pode enganar em todos, sabe-se lá!
Se calhar é azul
Ou vermelha,
Ou preta, que horror!
Árvore preta.
E dá flores falsas, é tudo falso.
Mas parecem mesmo genuínas.
Marina admira muito aquela
Árvore falsa, que imita tão bem uma verdadeira.
Falsa! Falsa!
Sussura baixinho Marina à sua beira,
A fingir o que não é, sua Falsa Pimenteira!
poema de Sara Monteiro
in As férias de Mário e Marina
ilustração de Morteza Zahedi
É verde
Como todas as árvores.
“Parece” verde,
Porque se é falsa deve estar a mentir.
Fingirá que dá pimentos?
Dará falsos pimentos?
Se calhar nem é árvore.
Pode não ser.
Se é falsa
Pode ser um pássaro
Ou um navio.
É dissimulada
Finge o que não é,
Esconde.
Engana.
E não é verde,
Verde é a sua cor mentirosa.
Se engana num aspecto
Pode enganar em todos, sabe-se lá!
Se calhar é azul
Ou vermelha,
Ou preta, que horror!
Árvore preta.
E dá flores falsas, é tudo falso.
Mas parecem mesmo genuínas.
Marina admira muito aquela
Árvore falsa, que imita tão bem uma verdadeira.
Falsa! Falsa!
Sussura baixinho Marina à sua beira,
A fingir o que não é, sua Falsa Pimenteira!
poema de Sara Monteiro
in As férias de Mário e Marina
ilustração de Morteza Zahedi
quarta-feira, 1 de junho de 2011
Se
Se o meu coração fosse o céu
Quem mandavas lá voar?
Se o meu coração fosse um lago
Quem mandavas lá navegar?
Se o meu coração fosse um bosque
Quem mandavas lá passear?
Mandava o meu coração
P’ra no bosque se perder.
Mandava o meu coração
P’ra no bosque se encontrar.
Quem mandavas lá voar?
Se o meu coração fosse um lago
Quem mandavas lá navegar?
Se o meu coração fosse um bosque
Quem mandavas lá passear?
Mandava o meu coração
P’ra no bosque se perder.
Mandava o meu coração
P’ra no bosque se encontrar.
poema de João Pedro Mésseder
in De que cor é o desejo?
ilustração de André Letria
in De que cor é o desejo?
ilustração de André Letria
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