quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A laranja

A laranja redonda
Caiu da laranjeira
Caiu no chão
A menina apanhou-a
Segurou-a
Com a mão esquerda
E descascou-a
Com o polegar da mão direita
(Tão doces as suas mãos!)
E a menina depois
Separou os gomos
Um a um
E comeu a laranja
Devagarinho
Como se fora uma flor
De Sol
E seus olhos
Luziam verdes
Sobre a luz
Da laranja
Doce
Desfolhada


Poema de Matilde Rosa Araújo
in Mistérios
Ilustração de Eric Carle

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Buracos negros




As estrelas também gostam de brincar
às escondidas
A maioria das vezes escondem-se umas atrás das outras
ou nas imediações de um quasar
Mas não há melhor lugar
para uma estrela se esconder
que num buraco negro
Elas vêm as outras
e ninguém as consegue ver


Poema de Jorge de Sousa Braga
in Pó de Estrelas
Ilustração de Brad Holland

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Fala-bicho

Quando um gato encontra um rato
foge o rato e corre o gato.
E se o gato apanha o rato
chora o rato e ri o gato
Mas se o rato escapa ao gato
chora o rato e ri o gato.
"Sape gato, sape gato".



Poema de Violeta Figueiredo
Ilustração de Antònia Tinturé

segunda-feira, 8 de julho de 2013

As couves


Couve de Bruxelas
Couve lombarda
Couve-galega
Couve roxa
Couve-flor...

Porque é que nunca houve
ninguém que lhes fizesse
um poema de amor?



Poema de Jorge Sousa Braga
in Herbário
Ilustração de Martin Jarrie

terça-feira, 14 de maio de 2013

O cisne

O cisne
branco
do lago
todo
silêncio
se vai
como
quando
a noite
no fim
do dia
cai...

Poema de Pedro Alvim
in Sofia só
Ilustração de Majali

terça-feira, 23 de abril de 2013

Apetece-me dançar

Apetece-me dançar
ao som do luar
- esse violino
que os outros não ouvem...
Ouviu-o Mozart...
Ouviu-o Beethoven...

Mas, hoje sou eu
que o ouço no céu
e danço na terra
com pés de cetim,
lá fora na rua...

Sou eu, pelo Ar...
Sou eu, o luar...
(...que arranquei de mim
e atirei para a lua.)


Poema de José Gomes Ferreira
in Poesia II
Ilustração de Joanna Concejo

quinta-feira, 14 de março de 2013

Coisas que não há que há


 
Uma coisa que me põe triste
é que não exista o que não existe.
(Se é que não existe, e isto é que existe!)
Há tantas coisas bonitas que não há:
coisas que não há, gente que não há,
livros por ler, coisas por ver,
feitos desfeitos, outros feitos por fazer,
pessoas tão boas ainda por nascer
e outras que morreram há tanto tempo!
Tantas lembranças de que não me lembro,
sítios que não sei, invenções que não invento,
gente de vidro e de vento, países por achar,
paisagens, plantas, jardins de ar,
tudo o que eu nem posso imaginar
porque se o imaginasse já existia
embora num sítio onde só eu ia...


Poema de Manuel António Pina
in O pássaro da cabeça
Ilustração de Suzy Lee

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

As flores do jacarandá


O jacarandá florido
Brando cantar trazia
Branda a viola da noite
Branda a flauta do dia

O jacarandá florido
Brando cantar trazia
O vinho doce da noite
A água clara do dia

Quem o olhava bebia
Quem o olhava escutava
O jacarandá florido
Que o silêncio cantava





Poema de Matilde Rosa Araújo
Ilustração de Amy Ruppel


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

O Universo



Uns dizem que é aberto
Outros que é fechado
Outros
Ainda que é plano

Cada um consoante o seu desejo

Para mim o universo
Tem a forma de um beijo


Poema de Jorge Sousa Braga
in Pó de Estrelas
Ilustração de Oliver Jeffers

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Avestruz


 
Na juventude gostava de pregar
partidas: batia às portas e fugia.
Por isso ficou conhecida como a aves-truz.
Se a vires não lhe lembres o passado.
Ela esconderia a vergonha na areia.


Poema de Francisco Duarte Mangas
in O noitibó, a gralha e outros bichos
Ilustração de André Letria