terça-feira, 29 de novembro de 2011
A canção dos adultos
Parece que crescemos mas não.
Somos sempre do mesmo tamanho.
as coisas que à volta estão
é que mudam de tamanho.
Parece que crescemos mas não crescemos.
São as coisas grandes que há,
o amor que há, a alegria que há,
que estão a ficar mais pequenos.
Ficam de nós distantes
que às vezes já mal os vemos.
Por isso parece que crescemos
e que somos maiores que dantes.
Mas somos sempre como dantes.
Talvez até mais pequenos
quando o amor e o resto estão tão distantes
que nem vemos com estão distantes.
Então julgamos que somos grandes.
e já nem isso compreendemos.
poema de Manuel António Pina
in O pássaro da cabeça
ilustração de Beatrice Alemagna
sexta-feira, 25 de novembro de 2011
Sem nunca parar
No centro da Terra
Há um pássaro verde
Que voa, que voa
Sem nunca parar.
No centro da Terra
Há um pássaro verde
Da cor do silêncio,
Da Lua, do mar.
No centro da Terra
Há um pássaro verde
Que voa, que voa
Sem nunca parar.
Por dentro do peito
Há um peixe dourado
Que canta, que canta
A mais linda canção.
Por dentro do peito
Há um peixe dourado
Dormindo acordado
No teu coração.
Por dentro do peito
Há um peixe dourado
Que canta, que canta
A mais linda canção.
À volta do mundo
Há um circo de luz
Que brilha, que brilha
De noite e de dia.
À volta do mundo
Há um circo de luz
Que espalha em redor
Uma doce magia.
À volta do mundo
Há um circo de luz
Que brilha, que brilha
De noite e de dia.
poema de José Fanha
ilustração de Loreto Salinas
terça-feira, 22 de novembro de 2011
Aquela nuvem
Aquela nuvem
Parece um cavalo...
Ah! Se eu pudesse montá-lo!
Aquela?
Mas já não é um cavalo,
É uma barca à vela.
Não faz mal.
Queria embarcar nela.
Aquela?
Mas já não é um navio.
É uma torre amarela
A vogar ao frio
Onde encerraram uma donzela.
Não faz mal.
Quero ter asas
para a espreitar da janela.
Vá, lancem-me ao mar
Donde voam as nuvens
Para ir numa delas
Tomar mil formas
Com sabor a sal
- Labirinto de sombras e de cisnes
No céu de água-sol-vento-luz concreto e irreal...
poema de José Gomes Ferreira
in Poesia IV
ilustração de Selda Soganci
quinta-feira, 17 de novembro de 2011
O vento
Por mais que tente, o vento
Não consegue adormecer
Se não tiver nada para ler.
Seja uma folha de tília,
De bambu ou buganvília.
É por isso que o vento
Arrasta folhas consigo,
Até encontrar um abrigo,
Onde possa adormecer.
Arrastou até a folha,
Onde eu estava a escrever!
in Herbário
ilustração de Katsumi Komagata
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
A língua de nhem
Havia uma velhinha
que andava aborrecida
pois dava a sua vida
para falar com alguém
E estava sempre em casa
a boa velhinha
resmungando sozinha:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
O gato que dormia
no canto da cozinha
escutando a velhinha
principiou também
a miar nessa língua
e se ela resmungava,
o gatinho a acompanhava:
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem
Depois veio o cachorro
da casa da vizinha,
pato, cabra e galinha
de cá, de lá, de além
e todos aprenderam
a falar noite e dia
naquela melodia
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
De modo que a velhinha
que muito padecia
por não ter companhia
nem falar com ninguém,
ficou toda contente,
pois mal a boca abria
tudo lhe respondia
nhem-nhem-nhem-nhem-nhem-nhem...
poema de Cecília Meireles
in Ou isto ou aquilo
ilustração de André da Loba
quarta-feira, 9 de novembro de 2011
A amiga da China
Tangerina que tanges
O Sol do meio-dia
És cara de menina
Com pintas de alegria.
Teus gomos perfumados
Tua pele tão fina
Tangerina tão doce
Que vieste da China
Quando ia para a escola
Teu perfume nas mãos
Teu perfume no bibe
Nos cadernos. No pão.
Tu eras tão bonita!
Eu era tão menina!
Que saudades eu tenho
Minha amiga da China!
poema de Matilde Rosa Araújo
in As fadas verdes
ilustração de Elena Odriozola
in A bela mandarina
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